Abro a porta do quarto como se fosse uma passagem para outra época. Um portal que me faz voltar à noite de ontem, onde, embriagado, entrava com duas garotas neste quarto. Elas já saíram, a loira e a morena, altas, bonitas, gostosas. Ambas me pegaram o dinheiro e saíram. Sem olhar para trás, sem um beijo de despedida, sem um aperto de mão.
O corredor me leva até o elevador, que agora aparenta estar mais longe do que ele realmente está. Estou exausto e minhas pernas parecem não querer andar. Meus ouvidos estão mais atentos ao pulsar de meu coração do que ao ambiente externo, onde logo na porta à frente saem barulhos de um casal se amando (ou se maltratando, pelos gritos). As paredes são de listras verdes, que descem ao chão e misturam-se com o carpete estampado e sujo. Aos pés da minha porta está sujo de vinho, mancha de vômito e duas moedas de cinco centavos. O casal para de gritar e começam a quebrar coisas em uma discussão sem fim. Diz ela que ele não tem mais tempo para ela, e que ele nunca a amou verdadeiramente. Quem seria a tal de Suzana que ela alega ter sido chamada? Pobre mulher, mal sabe como é para um homem amar apenas uma mulher e dedicar parte de seu dia, de sua vida para amá-la; e esse tinha duas. Deveria ganhar um prêmio de homem do ano, por conseguir administrar o seu amor para duas ao mesmo tempo. Eu aqui, de ressaca, encostado na porta, sem forças para levantar, e aquele homem amando dois seres ao mesmo tempo. Campeão.
O fim do corredor, com uma lâmpada piscando, está sóbrio. Sem mais ruídos, sem mais pessoas, sem mais vida. Ando por ele, encostando na parede e ajustando a gravata torta. Com o paletó na mão, tento me lembrar qual foi o motivo de tamanha comemoração de ontem. Comemorei por estar vivo? Ganhei a promoção na concessionária de carros e terei, finalmente, o meu conversível? Fui demitido? Não consigo lembrar, e por mais que eu pense minha cabeça apenas dói. A única pessoa que tem consciência de minha vergonha sou eu. Talvez eu, e o guarda que vigia a câmera de segurança, que agora me segue como se eu fosse roubar alguma coisa, arrombar alguma porta ou sair correndo sem pagar. Se minhas pernas me obedecessem.
A verdade é que eu nunca fui bom em comemorar, sempre exagerei quando não devia e reprimi quando era para exagerar. Nunca demonstrei o que sentia pela mulher que amava, até ela não aguentar mais não ser correspondida e me deixar. Me largar. Com todos os planos, com todas as metas e tudo o que eu havia pensado em realizar ao lado dela. Com ela, sem ela saber. Ontem devo ter comemorado muito bem, pois algo especial aconteceu; apesar de eu não me lembrar. Ontem eu devo ter olhado, assim como todas as noites, a sua foto antes de cair no sono. Ontem eu devo ter te deixado em meio à prostitutas e vinho, pois não te acho em minha carteira, não te acho guardada em seu lugar especial, não te acho.
Porra Gui!! É um belo conto, só que eu o imagino em décadas passadas, acho que é porque me lembra áqule que eu te falei que eu tinha feito... Muito boa essa "atmosfera".
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